sexta-feira, 18 de janeiro de 2013




VIVA O AFETO!

Tudo vinha se arrastando. Os horários eram mais ou menos cumpridos. Nada que fugisse muito do acertado. O tempo ia também fluindo, como só ele sabe passar. Sem ninguém perceber. E já era Janeiro. Aquele fim de semana, porém, marcara profundamente o Carlos. Carlão era coisa do passado, bem remoto. Hoje, já é quase um Carlinhos em busca dos seus direitos.

Queridos leitores, sintam pena do Carlos.

Quando entrou na delegacia, estava mesmo no bagaço. Mas, logo, recuperou a postura e começou a discorrer sobre o ocorrido. Sua ex-mulher, dessa vez, tinha se excedido. No final do ano, no último fim de semana, resolvera descumprir, de fato, o acordado. Por isso, estava ali para registrar a ocorrência.

Eu, escondidinha, ouvia aquelas ponderações de Carlos, suas razões e o silêncio da inspetora de polícia que lavrava o ato. Tive até vontade de intervir para reforçar o depoimento. Porém, devido a minha pequenez, permaneci quieta e calada na minha insignificância.

E Carlos argumentava que sua ex-mulher acabaria não tendo recursos para manter aquela nova situação que se prenunciava. Que, recentemente, ela adquirira outro ser da mesma espécie. E a inspetora ia anotando tudo.

Por fim, disse que não pretendia levar o caso à Justiça. Esse ato de agora era apenas para assustá-la.

Eu que, quando posso, costumo atazanar o vivente pra valer, acho que o Carlos deveria levar adiante essa ocorrência. Ganharíamos nós, os dois. Eu que ando carente, que gosto de me grudar mais que pepino no baraço, eu acho que as coisas tendem a piorar se o Senhor Juiz não intervier.

Agora, sinceramente, acredito que caiba a ele dar uma última chance àquela ex-mulher desnaturada.

Isso não se faz com a gente.

O Carlos está “precisado” daquele que o acompanha nos passeios pela praça próxima a sua casa, pelas ruas do bairro. Recém aposentado, com aquele chamariz pela mão, até tem lançado olhares para a Cláudia, dona de um Shih-Tzu. Quem sabe?

Eu, por mim, asseguro que essa história é verídica. Eu a presenciei.

Claro, não como uma pulga, dessas metidas, que acompanha o Carlos e o seu fiel cãozinho.

Aliás, se a ex-mulher souber da minha existência, é capaz de registrar uma ocorrência por questões de higiene. Daí, o Carlos vai se ferrar.

 

Pessoal, brincadeiras à parte, o cidadão registrou uma ocorrência policial por descumprimento de visita, aos fins de semana, do cão (ou cãozinho).

Pena que não fiquei sabendo se havia filhos oriundos do casamento, já desfeito há algum tempo.

Também, isso é apenas um detalhe.

O afeto, às vezes, vem do convívio, da carência do ser humano e da dependência contínua, assegurada, do ser ali posto a conviver.

É que, muitas vezes, o ser, que se torna independente, nem sempre é de fácil convivência. Também porque, frequentemente, o mundo já o levou. Pelo menos, nos tempos atuais.

Haja vista o que me relatou um conhecido que, depois de um dia exaustivo de trabalho, quando retorna ao lar, doce lar, quem o recebe? Seu cão, feliz, abanando o rabo. Sua mulher está não se sabe bem onde, fazendo não se sabe o quê. Seus filhos? Estão pelo mundo afora.

O resto são detalhes.

Viva o afeto!






P.S:

A imagem, traduzida nos versos de Gujo Teixeira e na música de Diego Espíndola, na milonga Pra Quem Partiu, cantada por Luiz Marenco, diz bem de uma realidade onde o sossego, um cusco e um bom mate identificam o galpão do xiru. Pajador e guitarreiro, de tardezita, de vez em quando, pega da velha guitarra. É quando ela canta saudades pra ele.

O resto são detalhes.


Vivam os afetos!
 
 
 
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Comentário via -email:
 
Fernanda escreveu:
Eeee! Viva o afeto!
Aqui em casa tem bastante...
Abraço afetuoso
Lua,Célia,chica...rsrs
Bjo




quinta-feira, 10 de janeiro de 2013



SALVE O ANO DA...
                             SEDUÇÃO!

Enroscada, apropriando-se do território, às vezes meio escondida, outras bem à mostra. Por ser do tipo água, vai escoando através de qualquer barreira.

Lá, não sei bem onde, deveria haver muitas árvores, quem sabe fios d’água, fazia ela uma introspecção profunda sobre aqueles dois seres ali postos, frente a frente e frente a ela. Por possuir um grande poder de concentração, planejava tudo de forma calculada, cautelosa, sem se distrair com nada. Bastante prática, objetiva, observadora e pacienciosa, já trazia no gene a perícia para controlar pessoas. Portanto, convenhamos, foi certeira quando inoculou seu veneno da sedução e do arrojo naqueles dois “pobres seres infelizes” que ali estavam a esperar pelo não se sabe o quê, para não sei quando. Aquela coisa chata, insossa que devia ser estar por ali ao Deus dará.

E Deus acabou dando um castigo tão grande, mais tão grande que aqueles dois pobres acabaram sendo jogados aqui pra baixo. Tudo por causa daquela cobra que, lá, nem parecia tão grande coisa. Mas que, aqui, faz uma falta danada para aqueles dois. Com certeza, ela ajudaria a engolir muitos dos sapos que vicejam por esse mundéu. E que só os dois têm que engolir. Foi uma mancada, mesmo. Será?

Uma coisa é certa: de cobra os dois entendem como ninguém. Ah, casalzinho bom de pegada!

Mas como não só de prazer vive o homem, ela também serve para azucrinar. Serve de aviso para quem se vê frente ao perigo, numa conversa despretensiosa de alguém “mui amigo”, tipo cobra mandada. Pode ser também, uma cobra criada só para atazanar, que nem aquelas do tipo boas de briga. Aquelas que brigam à toa. E outras, como também outros, que são verdadeiras cobras no que fazem. Tem aquelas que fulminam com tal olhar de inveja, tornando-se tão venenosas que causam estragos dignos do Guinness. Têm aquelas outras tão cobras, mas tão cobras que costumam dizer cobras e lagartos dos outros e nem olham para si próprias. Mas há quem, costumeiramente, mate a cobra e mostre o pau. O que anda difícil, pois todo mundo anda dizendo coisas, difíceis de provar. Especializam-se em fazer coisas, sem deixar rastros.

Agora, cobra que é cobra mesmo, daquela com estilo, tipo essa característica do ano de 2013, que é a chamada Serpente Água, não deixa rastros. Escorre como a água e se some pelos caminhos da vida.

Portanto, estamos cercados. Mas, relaxemos!

Como já cantou o mestre Chico Buarque, em famoso samba de Arlindo Cruz e Carlinhos Vergueiro, LUGAR DE COBRA É NO CHÃO.

Ou, como diz o samba LETREIRO, de Roque Ferreira e Dunga, gravado por Zeca Pagodinho, “QUEM COME VENENO SABENDO, TÁ MESMO QUERENDO IR PRO LADO DE LÁ”.

E foi o que aconteceu com o casalzinho. Vieram parar aqui.

Eu tenho pra mim que saíram ganhando. Pelo menos, estamos por aqui para poder curtir esse nosso Éden que, claro, poderia ser bem melhor.

Isso se a cobra fosse apenas um símbolo fálico e nos preocupássemos mais com o Planeta Terra, sua água, com todos os irmãos, sem fronteiras, ou com o céu dos passarinhos, como diz a letra cantada pelo grande Chico: outro cara cobra no versejar.

A sedução está no ar. Aproveitemos o que há de bom nela e planejemos nossas tarefas com determinação, foco e disciplina, nunca perdendo os objetivos de vista.

Afinal, sigamos o exemplo da Serpente da Água que rege 2013, de acordo com o Horóscopo Chinês.

Ah, ia esquecendo! Diante desse quadro, em que ela aparece soberana, há esperança que a saúde melhore em nosso país, considerando-se que é ela, justamente, o símbolo que identifica a Medicina e o próprio SAMU.

Oh, SUS!

Com esperança, aguardemos.

 









terça-feira, 25 de dezembro de 2012

DIAS MELHORES

Vire a página, leitor. Mais um esforço e o livro terá acabado de ser lido. Se exigiu certo esforço, nem sempre é porque foi enfadonho. Às vezes, por ser mais denso, demanda uma reflexão maior, o que acarreta maior tempo na leitura. Mas isso é bom. Com certeza, deixará em nós, leitores, um saldo positivo no conhecimento das coisas, das gentes, do mundo.

É como o ano que passa, o calendário que se soma a outros e mais outros. Um artifício que criamos para não nos perdermos na poeira dos dias. Alguns desses são mais cinzentos, mais sombrios, mas não menos ricos. Às vezes, até o são bem mais produtivos que os ensolarados. Talvez, esses nos deixem mais lentos, menos criativos. O saldo do dia pode ser que seja bem menos rico do que aquele em que o céu plúmbeo esconde o que está por vir.

De qualquer sorte, esse correr inexorável do tempo apresenta, a cada minuto, incertezas, pois essas fazem parte do futuro: o futuro dos 60 segundos seguintes ao agora.

Portanto o hoje, este instante de agora, é o que interessa de verdade. Não quer dizer que não devamos nos preparar para o dia de amanhã. Porém, se esse momento presente for bem aproveitado, influenciará os que se seguirem. Tudo é um encadeamento. Assim, vamos nos construindo, nos modificando, e mudando de aspecto com o tempo.

Aliás, Mário Quintana escreveu sobre o Tempo. Disse ele:

“O tempo é um rato roedor das coisas, que as diminui ou altera no sentido de lhes dar outro aspecto”.

Também escreveu:

“Não importa ao tempo o minuto que passa, mas o minuto que vem”.

Pois a nós interessa mais o minuto que passa, do que aquele que vem. Até porque não se sabe se para nós virá.

E a esperança?

Há quem diga, herança dos estoicos, que ela é a maior das adversidades. Porque seria, por natureza, aquela tensão insaciada. Viveríamos atrás, constantemente, da chamada felicidade. Estaríamos sempre em busca da tal felicidade. Ainda, para complicar, depositaríamos NELE a esperança de melhores dias, herança cristã.

Passados os tempos, impôs-se, através de uma nova teoria do conhecimento, uma nova ordem no mundo, que não é mais dada, e sim construída. E se assim é, depende mais de mim do que do DIVINO o alcance de melhores dias e, consequentemente, da felicidade.

De qualquer maneira, seguindo por essa trilha, do esforço pessoal, ou pela outra, a da inércia ou resignação, o fato é que os dias se sucedem. E, no fundo, esperamos que sejam sempre melhores do que os anteriores.

Então, que sejam, efetivamente, os dias melhores, aqueles que estão por vir.

Agora, dada a nossa fraqueza e pequenez, nada melhor do que pedirmos a ajuda DELE nessa caminhada. Tudo com muita Fé e Trabalho.

Que a virada do ano traga dias melhores.

Aliás, não apenas aguardemos, mas, juntos, construamos DIAS MELHORES.


UM FELIZ 2013 A TODOS!
 
 
 
Dias Melhores – Jota Quest
 




segunda-feira, 24 de dezembro de 2012


 
A LUZ

A chama pequenina tremulando se debatia.

Era uma vela pendurada num pinheiro que, no teto, quase batia.

E eram muitas em seus castiçais.

E os olhinhos, cá embaixo, a acompanhar a dança das luzinhas.

Umas pra cá, outras pra lá,

Num espetáculo que já se repetia desde os meus ancestrais.


Criança ainda, esperava vê-la todos os dias.

Mas outra árvore de Natal, só no novo ano.

Guardava, então, a imagem da árvore, toda iluminada,

Como se ela não apagasse até o raiar de uma nova madrugada,

Que estava bem longe,

Embora eu com ela sonhasse a cada noite estrelada.


Não sei se foram as luzes ou as velas.

Ou, quem sabe, cada uma delas.

Num instante, não sei onde e nem quando,

Transformei esse encanto

Em um novo encontro:

De mim com as velhas luzes.


E percebi,

Embora distante no tempo,

Meus olhos ainda sedentos de luz.

Buscando a magia da surpresa naquilo que reluz.

Lá, onde o sonho fez morada e se fortaleceu.

Lá, onde me abasteço.

Lá, onde me reconheço.

Lá, onde meus olhos buscam sempre um novo começo.


Isso é o tempo.

Aquele está ainda iluminado.

Mas é neste que vivo inteira,

Iluminada e iluminando todos os sonhos meus.

Porque vivo ainda daquela LUZ.

A LUZ primeira, a da Criação.

A LUZ que sobrevive.

Aquela que se eternizou.



Que o SEU FILHO mantenha a chama, que nos ilumina, para todo o sempre.

UM FELIZ NATAL A TODOS!



 
 
 
Andre Rieu – Silent Night, Holy Night
 
A Harpa e a Cristandade – Luis Bordon
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

quinta-feira, 13 de dezembro de 2012


 










ESSE TAL “DEVIR”

Pois o taura Juvenal andava preocupado. Já nem pregava o olho direito à noite.

Escutara, lá nos galpões, a peonada falando umas doidices. Que estaria tudo por acabar! Que não iria sobrar ninguém pra contar história. Dos detalhes não se falava. A coisa, diziam, ia ser feia! Mas como estava acostumado a enfrentar qualquer entrevero, não se assustava tão fácil.

O problema é que essas conversas estavam se alongando demais. E isso estava deixando Juvenal mais nervoso que potro com mosca no ouvido.

Então, nada melhor para se tranquilizar do que ir se aconselhar com Theobaldo, um antigo patrão. Aquele gaúcho macanudo sabia tudo de tudo e de todos. E o tal era auxiliado pelo filho, o patrãozinho Ricardo, guri que estudava na cidade grande e que estava de férias, casualmente. Pois foi ele que dissera que Theobaldo, seu pai, tinha até uma certa parceria com Deus, pelo menos no nome. Imagina que Theo queria dizer Deus, numa tal língua antiga, chamada dos gregos.

O que Juvenal buscava era explicação para essa conversa que corria pelos galpões. Uma história que o estava deixando mais assustado que guri na zona. Na verdade, depois desse encontro saiu mais bem informado que dono de funerária e, claro, mais tranquilo que vaca na Índia.

Pois o tal guri estava presente quando Juvenal foi ter com Theobaldo. E foi aí que começou o enrosco na cabeça do vivente. Quando parecia que começava a entender a explicação do patrão Theobaldo, lá veio Ricardinho e conseguiu deixar a coisa mais enrolada que namoro de cobra.

O que o patrão tinha falado é que Juvenal não precisava ficar preocupado. Notícias desse tipo já tinham surgido muito antes. Não era de hoje que se falava que o mundo iria acabar. Mas, até hoje, nada acontecera. Começou, então, a lembrar de vários momentos, no passado, em que essa notícia também surgira e nada acontecera. O dia seguinte amanhecera igualzito ao anterior, com as mesmas vacas no pasto, com os peões mateando cedito no galpão, antes das lides campeiras. Tudo parecendo igual ao dia anterior. Esse igual é que era diferente.

Pois foi aí que o Ricardinho resolveu dar o ar da graça. E começou uma conversa difícil de entender, mais complicada que fala de gringo.

O guri foi dizendo que tudo, todos os dias, é diferente. Nada se repete duas vezes. Falou de um tal de Heráclito, da turma dos gregos, que ele tinha estudado. Juvenal não entendeu muito bem o exemplo que o guri tomou emprestado do filósofo. A tal corrente de um rio que a gente toca quando entra n’água. E, quando se entra de novo, já é outra água. Daí em diante, quando o patrãozinho falou em devir, a coisa complicou mais ainda para Juvenal.

Theobaldo, nessas alturas, olhou de atravessado para Ricardinho. Mas o guri resolveu dar a volta por cima e apelou para o que Juvenal conhecia muito bem: os “bate-coxas” na casa de Siá Maria. E disso Juvenal entendia.

Daí o guri lembrou a preferida de Juvenal, a Maricota do bolicho. Pois, a cada bailanta, Juvenal dançava com Maricota, mas era sempre diferente. Ou não era? As vaneiras nem sempre eram as mesmas. Às vezes, eles começavam a dançar de um jeito, às vezes de outro. O taura concordou que era isso mesmo. Só que acrescentou, com olhar de capivara, que geralmente terminavam sempre do mesmo jeito.

O guri, com essa, resolveu fazer-se de desentendido.

Enquanto isso, Theobaldo começou a achar que o filho tinha dado conta do recado. Juvenal parecia que ia entendendo melhor essa história de que nada se repete, de forma totalmente igual.

E isso ia ajudando Theobaldo a chegar onde queria, isto é, demonstrar ao Juvenal que, embora ele nunca tenha percebido, as coisas nunca se repetem. Assim, tudo se acaba num dia e recomeça no seguinte, de outra forma, embora pareça tudo igual.

Dessa forma, o patrão foi tranquilizando Juvenal, ao retirar do vivente aquela sensação de fim de mundo, de terra arrasada.

Portanto, tudo, todos os dias, acaba. E nada, no dia seguinte, é exatamente igual. Mesmo assim, tudo permanece existindo. Inclusive, é claro, Maricota.

E Juvenal, confirmando ter entendido a lição, acrescentou que, com certeza, Maricota amanhecia diferente depois de um bate-coxa num surungo bem bagual. Diferente, mas sem deixar de ser a Maricota, aquela do Bolicho do Guedes. Ela que, a cada baile, terminava a noite nos pelegos de Juvenal. Aliás, os pelegos estavam na hora de serem trocados, pois já não eram os mesmos também.

Satisfeito foi-se Juvenal embora, achando que esse tal devir tinha saído melhor do que a encomenda.



Quanto ao fim do mundo, o bicho não era tão feio, conforme estavam pintando.

E Theobaldo, acolherado assim com Deus, ia saber das coisas bem antes. Não ia?

Diante disso, o vivente saiu despacito, mais devagar que tropa de lesma, pensando na última frase do patrão:

“Deus sabe o que faz; o homem não sabe o que diz”.





Grupo Minuano – no Rancho da Candoca
 
Tranco Serrano – Surungo Campeiro
 




 




quarta-feira, 21 de novembro de 2012










QUANDO O MENOS É O MELHOR
 
 
Fisionomias que se crispam, corpos que se contorcem, gritos que não se ouvem, tudo em meio à fumaça que emerge de todos os lados.

O espaço onde tudo acontece é relativamente pequeno. Quando a porta da sala é aberta o som que se projeta é ensurdecedor. Acredita-se que em torno de 100 decibéis. Quem canta e o que se canta, não interessa muito. É um ritmo, ou melhor, uma batida que serve apenas para incentivar e acelerar os movimentos frenéticos de quem lá dentro se encontra.

Ao lado dessa espécie de estúdio, há um amplo salão, com inúmeras mesas, onde podem acomodar-se em torno de cinquenta pessoas. Também aqui, o som é tão alto que não permite uma conversa entre dois convidados, sentados lado a lado. O som, nesse espaço, deve beirar em torno dos 85 decibéis.

Pois este cenário é uma festa de aniversário de uma jovem que está completando 13 anos. Seus convidados, em torno de 30 colegas de escola, encontram-se, também, na faixa etária entre 11 e 13 anos.

No salão, antes descrito, reuniram-se, nessa festa, apenas quatro adultos. Estava, portanto, praticamente, vazio. Ainda assim, tinham esses convivas dificuldade de comunicação entre si.

Não havia, por óbvio, bebida alcoólica, mas apenas refrigerantes e água mineral. Respeitou-se, nesse particular, a legislação consubstanciada no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).

Agora, o protagonista da festa, o principal personagem, não foi a aniversariante. Foi, meus senhores, o DJ. Nada contra os DJs, muito pelo contrário.

Os pais, que buscaram seus filhos ao final da festa, nem perceberam a altura do som, pois muitos chegaram minutos após o término. E outros tantos, que chegaram antes, compareceram, aparentemente, apenas para buscar os filhos. O que estava por ali a acontecer, não fazia parte de sua atenção.

Para quem observou, durante quatro horas, atentamente o desenrolar de todos os momentos, percebeu cenas bastante sintomáticas dos malefícios que os decibéis em excesso causavam aos jovens. A maioria deles, quando saía do estúdio para comer alguma coisa, saía aos gritos de dentro da tal discoteca e assim permanecia, aos gritos entre si, do lado de fora. Outros, já ao término da festa, pareciam extenuados, a ponto de jogarem-se nas cadeiras, no salão maior.

Ao que se sabe, é comum esse quadro repetir-se, a cada aniversário, pois hoje “som e dança” fazem parte de qualquer festa.

Por outro lado, os pais parecem ignorar os malefícios causados pelo volume excessivo do som registrado nesses locais, não parecendo estar preocupados com a saúde de seus filhos menores de idade.

Portanto, considerando-se essa omissão dos pais e da própria legislação, acredita-se que caiba às autoridades competentes a regulamentação quanto à altura do som permitida para locais fechados, que sejam frequentados por menores.
 
Com relação aos maiores de idade, usuários desses ambientes, seriam necessárias campanhas de conscientização. Esperamos que os malefícios, advindos de um volume de som exagerado, não os tornem, no futuro, pessoas com deficiência de audição, entre outras manifestações que o organismo poderá apresentar.
 
Agora, quanto aos menores, é preciso que se assuma a responsabilidade por sua saúde, pois são absolutamente incapazes, enquadrados que estão, pelo Código Civil Brasileiro, na faixa etária até os 16 anos. (art. 3º, inciso I)

Quem sabe uma Portaria regulando o nível máximo de decibéis em “festinhas de aniversário”, promovidas em Casas de Eventos, para jovens até os 16 anos de idade, não seria a solução? Quem sabe?

O Estatuto da Criança e do Adolescente, por sua vez, em seu art. 149, § 1º, letra e, prevê que compete às autoridades judiciárias, levando em consideração, dentre outros fatores, a adequação do ambiente à eventual participação ou frequência de crianças e adolescentes, disciplinar, através de portaria, ou mediante alvará, o uso correto de tais ambientes. A solução na estaria na adoção dessa saudável medida no que tange ao volume de som permitido? O auxílio das Secretarias Municipais de Saúde e do Meio Ambiente, através de seus técnicos, seria determinante na elaboração de uma grade, e inúmeros estudos existem a respeito, com limites de decibéis compatíveis com o ouvido humano, que não causariam dano à audição desses jovens.

Paralelamente, caberia aos órgãos competentes do Município a fiscalização de tais ambientes frequentados por menores.

Essa medida seria de grande valia na preservação da saúde auditiva de nossos jovens, livrando-os, igualmente, de outras patologias advindas do impacto exagerado do som sobre o organismo humano.




Quanto ao gosto musical, isso já é assunto para outra crônica.

Nada contra o bate estaca.

Há quem, porém, prefira um bate coxa.

Assistam ao vídeo abaixo e formem sua opinião.


Bate Coxa no Totonho – Os Serranos


quinta-feira, 25 de outubro de 2012











AOS QUE JÁ SE FORAM

Na esquina encontraram-se. Uma esperava para atravessar, a outra também, só que no sentido contrário. Saia e blusa pretas e um olhar triste trazia uma. O sol que brilhava parecia relevar mais ainda a escuridão da figura. Joana permaneceu na calçada, esperando pela vizinha que se deslocava até ela. Trazia aquela no semblante a tristeza que já perdurava há dois meses.

Chegou e parou. Contou detalhes. Falou aquilo que disseram os irmãos na derradeira hora. Um acerto de contas de quem fica. Sem a contrapartida. Disse do seu descontentamento com tais falas. Ela, porém, não dissera nada. Ele também assim faria. E isso doía mais ainda. Não precisavam ter dito o que disseram, não havia necessidade. Principalmente, porque não havia mais possibilidade de resposta. Há coisas que se diz enquanto ainda existe sentido em dizê-las. Com a voz embargada, surpreendeu-se com Joana, olhos marejados de lágrimas, que tentava explicar a ela a catarse a que os irmãos haviam se submetido, oferecendo as falas, desnecessariamente, aos circunstantes.

E as duas, na esquina, alheias aos passantes, estiveram a ponto de romper em um choro convulsivo. Uma, pelo pai que se fora. A outra, pelas lembranças dos seus, que também já tinham se ido.

Contiveram-se, porém. Mantendo a conversa, racionalizaram a emoção do momento até que ela se dissipasse. E ela foi, aos poucos, sumindo.

O que faz a morte conosco!

Surpreende a quem a assiste, principalmente quando não é esperada. O que não era exatamente o caso. O seu pai iria completar 101 anos dali a dois meses. Mais de cem anos de vida, parece muito tempo. Para a vizinha, porém, não foi. Havia muito ainda a falar, a dizer, a conversar, a se identificar. Ela que era a mais parecida com ele. Acredita, por isso, que, ao contrário dos irmãos, dissera ao pai, quando vivo, tudo o que quisera e que achara importante à época. Essa também era uma marca conhecida do pai: dizer direto ao interlocutor o que pensava a respeito de tal ou qual coisa.

Pois Joana, a vizinha que aguardara na calçada, aquela que se emocionara, chegando às lágrimas, crê que temos e teremos sempre dificuldade enorme em recebermos essa visita indesejada. Esse apagar abrupto, ou mesmo lento, da centelha que arde no peito de quem amamos, coloca-nos frente a frente com a nossa própria derradeira hora.

Os minutos passaram-se. A vizinha, ao final, conta ainda de seu temor em defrontar-se com pessoas falecidas. E isso ocorre mais à noite. Essa observação faz com que Joana, muito brincalhona por natureza, faça gestos de quem surge por detrás da cortina da sala, ou no vão da porta do quarto, brincando com o assunto. Tudo para descontrair.

A buzina insistente de um carro desperta a atenção das duas para o trânsito, que é intenso àquela hora.

Despedem-se, cada uma, tomando o rumo inverso. Uma que volta para casa, outra que segue para novo compromisso.

Pois, naquela esquina da vida, duas vizinhas aproximaram-se um pouco mais daquilo que nos faz, a todos, absolutamente iguais: o sentido de finitude. Seremos mesmo finitos? Há quem creia que não. Por enquanto, o que sabemos é que fizemos parte dessa teia chamada Vida.

Sabem de uma coisa? O melhor mesmo é deixar pra lá.

O sol ofusca o olhar de Joana. Com cuidado, atravessa a rua e vai lembrando-se dos seus queridos que já se foram. Teria ela, própria, dito tudo o que gostaria se tivesse tido oportunidade? Tivera ela oportunidade? Ou nunca ousara tal enfrentamento?

O tempo, que é sábio, sussurra-lhe que isso não mais importa.

Nesse Dia de Finados, nossa homenagem à lembrança de todos os que já partiram.



E para lidar com esse assunto, de uma forma mais campeira, nada melhor do que assistir ao vídeo do pajador Leonel Gomez cantando a música Campo Santo, de sua autoria em parceria com Rogério Ávila.


Aliás, para finalizar, como diz a letra, a mim, também, me gusta cruzar de largo...

Assistam e vejam se concordam com o pajador.