PAZ
O fogo atrai naquela gélida noite.
Todos ao redor como se estivessem absolutamente ligados
àquele ritual ancestral. Os gravetos, habilmente dispostos ao derredor de uma
lenha mais robusta, prendem o olhar do chiru. Os olhos de Teobaldo, peão de estância,
fixam-se na chama que crepita.
Que tonteria querer saber o que se passa com o peão do lado!
Está, também, ele preso pelo olhar ao fogo que arde. E assim estão todos por
ali: aquerenciados, irmanados, seduzidos pela chama que propaga luz e calor.
Um latido próximo desperta os homens. O cusco veio se juntar
aos companheiros de tropeada.
No descampado, hoje, não zune o minuano. Só o frio se
espalha pelo campo.
Esta noite, Teobaldo está pensativo. Na roda do tempo volta
à infância: aos tempos de guri. Vê-se encilhando um petiço e iniciando um
arremedo de doma dentro do cercado da fazenda, onde morava. Lembra-se de dar
voltas e voltas, no mesmo lugar, como se estivesse domando de verdade. E o poço
redondo em que buscava água! O balde, pendurado por uma corda, se sumia numa
escuridão também redonda, lá embaixo, longe dos seus olhos.
Estão por ali, agora, vários peões da estância. Lentamente,
os causos começam a despontar e a cuia, de mão em mão, vai celebrando a união
fraterna que a cena traduz.
Teobaldo, sentado num resto de tronco, com os ouvidos bem
atentos, vai escutando tudo o que pode. Com a mão estendida, pendente ao seu
lado, traça no chão um círculo dentro de outro círculo e, nesse, outro círculo
menor e, daí em diante, vai se perdendo em pensamentos.
No alambrado da vida, vai escancarando desejos, peleando
vivências, tropeando o dia a dia. Como um bagual, que não se entrega, desperta
das lembranças com o passar da cuia às mãos pelos companheiros do fogo de chão.
Ao lembrar-se do seio da mulher amada, no gesto de pegar a cuia, fixa o olhar
no verde da erva.
Descobre, naquele momento, ao sorver o mate, sua ligação ao
seio materno, aos olhos da amada, aos companheiros da roda de chimarrão. Dá
importância à chama de um amarelo intenso, à lua cheia, toda branca, pendurada
lá em cima, ao calor que cerca todos que ali estão. Em plena harmonia e paz,
Teobaldo permanece sorvendo, de olhos fechados, aquele mate bueno. Solito, em
seus pensamentos, vê o pampa sem aramados, sem fronteiras, com o minuano
zunindo e as melenas seguras pelo chapéu de beijar santo em parede.
O certo é que essa sensação de paz é o encontro do ponto de
equilíbrio: ele e o mundo. Teobaldo está ciente de que, nesse labirinto da
vida, cada um tem uma entrada e uma saída. Sem esquecer, é claro, do PATRÃO
que, da porteira, a todos vigia.
E a Terra, toda
redonda, vestida de azul, que a todos nutre e conserva, agradece o belo quadro
que com ela foi construído naquela noite.
Que nesse vinte de setembro, relembremos nossas façanhas,
nossos ideais, nossa visão libertária, mas, sobretudo, busquemos, sempre, acima
de tudo, a paz. Que entre nós, paisanos, reine a justiça, o entendimento e a
solidariedade: ingredientes saudáveis para uma coletividade que se quer modelo
para outras.
Uma viagem pela música gauchesca:
1. A GAITA GAÚCHA– Os Monarcas
2. CHEIRO DE GALPÃO – Os Monarcas
3. EU SOU DO SUL – Os Serranos
4. O RIO GRANDE ME CRIOU – Tchê Barbaridade
5. GRITOS DE LIBERDADE – Grupo Rodeio
6. NOSSA VANERA – Os Serranos
7. FULANOS E SICRANOS – José Cláudio Machado e Mauro Moraes
8. MILONGA ABAIXO DE MAU TEMPO – José Cláudio Machado eMauro Moraes
9. O GRITO DOS LIVRES – Dante Ramon Ledesma
10. ORELHANO – Dante Ramon Ledesma