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segunda-feira, 12 de setembro de 2022

NOVAS IMAGENS




Aquela passarinha, que fazia ninho naquela janela, sumiu.

Desapareceu. Seus dois ovinhos foram levados para não sei onde.

Desistiu de ali permanecer. Talvez, o local não fosse seguro para aguardar o nascimento dos novos seres.

Seu companheiro, por alguns dias, carregou gravetinhos e raminhos para formar um ninho.

A janela, à noite, era fechada. Embora a persiana ficasse afastada, quando baixada, o movimento e o barulho foram sinais de alerta para a mãe extremosa.
 
 


O sumiço deu-se em uma manhã. Ficaram, ali, apenas os raminhos.

Diferentemente do que ocorre com o sujo cobertor daquele ser que dorme, todas as noites, sob a marquise daquele prédio de esquina de uma rua bastante movimentada.

O cobertor, que tem dono, continua no mesmo local, faça chuva ou faça sol.

Quem por ali passa desvia o olhar, para não se sentir igual, mas é um ser igual ao que jaz na calçada.

O nome do condomínio, que o acolhe, chama-se Porto Seguro. O nome, talvez, seja convidativo. Quem sabe, as marquises, por serem alongadas, oferecem uma sensação de proteção.

Quem de nós, diante do quadro que se nos apresenta, é capaz de manter-se feliz e esperançoso?

A resposta, para que o cenário mude, é que tenhamos esperança, pois isto tudo vai passar.

Algumas etapas dessa gradativa mudança aparecerão no momento adequado.

Assim como as árvores, naquele quintal abandonado, estão verdejantes, pois a chuva e o sol são remédios eficazes para mantê-las saudáveis, nossas expectativas para novos tempos estão sendo, também, monitoradas por quem detém poderes para tanto.

Mantenhamos nosso olhar em busca do belo, pois ele existe e permanece entre nós. Nosso olhar vê, enxerga, mas, também, pode criar e tornar factível o que poderia parecer improvável.

O que pensar de quem em nada contribui para uma mudança tão necessária em nossa sociedade?

Nosso olhar amoroso e solidário tem que permanecer atento. Uma palavra de conforto faz toda a diferença diante de quadros de miséria humana tão deprimentes.

Buscarmos possíveis auxílios e soluções já seria um meio para que seres humanos não permaneçam nas sarjetas da vida.

E se as chuvas aparecerem e inundarem aquelas calçadas?

Que abrigos acolham estes seres ali jogados! A chuva e estes seres fazem parte do cotidiano de nossos bairros e cidades.


Aquele imundo cobertor

Aquele imundo pé

Aquele olhar constrangedor

De quem diz ter fé


Sejamos mais partícipes. A hora está aproximando-se.

Invistamos em nomes que representem mudanças reais de atitudes.

Precisamos mudar o cenário de nossas marquises.

Que a chuva que, ainda, nos ameaça seja apenas de alimento para nossas plantações, para nossos jardins, para nossos rios, riachos e lagoas. Que não faça parte da cama daqueles que não a possuem.

Que o bem-te-vi, que canta nos finais de tarde, seja um carinho aos nossos ouvidos. Um sinal de que há a possibilidade de vermos nossos irmãos ressurgindo dessa podridão em que se encontram.

Um bem-te-vi que cante a mudança possível para aqueles que ainda permanecem nessa condição.

Um bem-te-vi que acompanhe, com seu canto, a possível inserção desses indivíduos na condição de cidadãos.

Aguardemos essas novas imagens.

Um bem-te-vi, também, está vendo.

E, igualmente, aguarda.
 
 
 
 
 
 
 
 
 

domingo, 13 de março de 2022

AGUARDEMOS MUDANÇAS


A dúvida persiste sobre tudo e sobre todos.


A incerteza preenche os dias. E a desunião é o que mais salta aos olhos.

Para amenizar tivemos a 13ª Edição dos Jogos Paraolímpicos de Inverno.

A bela Cerimônia de Encerramento ocorreu hoje, em Beijing, na China.

Foram 9 dias de Jogos Paraolímpicos. Um congraçamento de vários povos ali representados por seus atletas. Quarenta e seis países e seus comitês participaram desses Jogos.

O show pirotécnico de despedida lembrou as ondas do tempo e as chamas que se altearam em corações para emoção de todos que assistiram.

Ficou a emoção e o reconhecimento aos inúmeros voluntários que colaboraram nesse evento.

Comprovou-se que, durante os Jogos, as diferenças não foram fatos de separação, mas de união.

Os próximos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos acontecerão na Itália, no inverno de 2026, nas cidades de Milano e Cortina D’Ampezzo.

O que esperar até os próximos Jogos?

Momentos difíceis, incertos e diante dos quais nossa força mental, em acreditar no amanhã, terá que ser refeita a cada amanhecer.

Sem discorrer, aqui, sobre o flagelo que acomete o Planeta nesses dois últimos anos, informações de especialistas na área são díspares.

Como acreditar?

Como percorrer os caminhos mais confiáveis?

Os habitantes deste Planeta sofrem com a manipulação de informações.

Alguém se encontra plenamente seguro sobre o que o cerca?

Pelo avanço da tecnologia tornamo-nos mais próximos uns dos outros. Isso, porém, não traz a segurança de que aquilo que nos chega seja verdadeiro.

Nossos mecanismos de defesa estão sempre em alerta. Isso compromete nossa paz interior.

Já, em nosso pequeno universo, caminhar, despreocupadamente, pelo parque é algo impensável. Até mesmo, em plena rua do bairro, já está inseguro.


Sair a passo...

Será que posso?

Meus olhos acompanham os passos

De quem, por todos os lados, pode interromper meu passo.

Isto é justo?

Ter que acelerar meus passos

Para escapar de um possível

Mãos ao alto?


Pode parecer exagero, mas não é.

Estamos enclausurados.

Quero acreditar, porém, que isso vai mudar.

Talvez, não estejamos muito longe desta mudança.

Sempre, é claro, com a ajuda DELE que, conforme diz parte da letra do samba CLAREOU que segue:



DEUS é maior!

Maior é DEUS e quem está com ELE

Nunca está só. 
 
O que seria do mundo sem ELE?
 
 
 
 
 
Coral Livre: Clareou (Serginho Meriti e Rodrigo Leitte)
 
 

terça-feira, 7 de julho de 2015

DESDE SEMPRE... NADA SERÁ COMO ANTES



Pezinhos aproximam-se, ligeirinho, do portão da rua e descem pelo caminho que leva ao pequeno armazém da esquina que vendia docinhos. Na bandeja, ao final do dia, restavam alguns farelos adocicados. Nada mais.

Tudo tão tranquilo, tão livre, tão natural.

Uma criança de tão pouca idade, nos seus cinco anos de vida, saía pelo portão para comprar docinhos.

Hoje, é absolutamente proibido tal comportamento pelo perigo real que ronda todos e tudo: não mais só as crianças.

Apenas a saudade será sempre igual.
A saudade daquilo que existiu, daquilo que foi.

Ir à escola pelos campos afora, sozinha, caminhando sem preocupação, cabelos ao vento e a pasta com os cadernos. Sem celular, porque não existia.

Hoje, impossível tal aventura diária.

Apenas a saudade será sempre igual.
A saudade daquilo que existiu, daquilo que foi.

Caminhar por ruas centrais daquela Cidade, ainda toda Sorriso, era um prazer. A jovem adulta, toda feliz, com um rubi pendurado ao pescoço, presente da avó, caminhava despreocupada com aqueles que, porventura, lhe observassem. Fossem conhecidos ou não, estivessem caminhando ao lado ou nas proximidades, isto era indiferente.

Hoje, impossível tal atitude.

Apenas a saudade será sempre igual.
A saudade daquilo que era, que tinha sido, que fora.

Deslocar-se a pé, em plena meia-noite, saindo de um show no Gigantinho e indo para casa, acompanhada pela mãe já idosa, seria isto possível?

Sim, elas e outras tantas pessoas, moradoras do bairro, percorriam ruas em plena madrugada, despreocupadamente. Todas ainda sob o impacto do belo espetáculo assistido, com os olhos ainda impregnados daquelas imagens que nos fazem vibrar por dentro, que nos enlevam. E tudo isto pela rua, rumo ao lar.

Lares cujas cercas ou muros não existiam. Onde a grama encostava na porta da frente e se estendia até o meio-fio da calçada. Sem grades, sem cercas, sem medo. Algo desconhecido hoje.

Apenas a saudade será sempre igual.
A saudade daquilo que tinha sido, daquilo que fora.

Ah! Como seria na Idade Média?

Por aqui, não sabemos.

Ainda não existíamos.

Um pouco depois, porém, já se enfrentaria a realidade do dia a dia. Pulando-se os primeiros trezentos anos, por volta de 1800, a título de passeio pela memória, com certeza existiram dificuldades. Quem sabe, incompreensíveis para a época. E a saudade dos séculos anteriores se estabelecia como consequência.

Apenas a saudade será sempre igual.
A saudade daquilo que tinha sido, daquilo que existira.

O tempo traz mudanças, mas todas, em certa medida, fizeram-se presentes em todas as épocas. O homem poderia, portanto, ir somando experiências e melhorando o seu interior no sentido de uma maior empatia com o seu semelhante. Salvaria com isto o outro que é a sua própria semelhança. Todos ganhariam. A Humanidade ganharia. A Cidade Sorriso ganharia.

E a saudade, talvez, nem tivesse assento, pois, a cada dia, seríamos melhores, mais humanos, mais civilizados.

Não sendo esta a realidade, permanece a saudade daquilo que antes era bem melhor.

E como nós humanos somos imperfeitos, a perfeição, talvez, nunca se alcance. E para sempre haja “aquela saudade” dos tempos antigos, em que parecíamos melhores do que somos hoje.

Na verdade, parece utópico perseguir-se tal caminho: o da perfeição.

Mas o que nos faz caminhar é justamente a busca pela utopia. Eduardo Galeano, escritor uruguaio recentemente falecido, estava certo. Ela serve para isso: para que não deixemos de caminhar.



E o título se comprova.

Desde sempre, nada será como antes. E os sonhos, por mais distantes que pareçam estar, servirão para que caminhemos em busca deles.

E a saudade daqueles tempos mais antigos, daqueles melhores tempos nunca cessará. Todas as mudanças geram desconforto e uma ponta de nostalgia dos tempos passados. Ainda mais quando elas dizem respeito à própria evolução do ser humano.

Portanto, enfrentemos os novos tempos, pois eles são, em essência, os mesmos velhos tempos, travestidos, porém, de modernos. E, por isso, novos para os olhares desse novo/velho homem.

Basta nascer, abrir os olhos e já preparar-se para sentir saudade do conforto que era aquele cálido berço em que se encontrava deitado o pequeno ser, até então.

Temos um esplêndido passado pela frente?
Para os navegantes com desejo de vento, a memória é um ponto de partida.                
                                                                     (Palavras Andantes – Eduardo Galeano)

E, em cada novo tempo, a saudade estará presente, mas a esperança, que com ela faz par, será sempre um caminho que se deixa de herança, conforme versos da música Novo Tempo, parceria de Ivan Lins e Vitor Martins.

Agora, vale a leitura de dois epigramas que seguem, criações de Mario Quintana, publicadas em seu Caderno H, que mencionam, de forma jocosa, o tempo e a percepção do homem sobre a relação sua com ele.








Novo Tempo – Ivan Lins








quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

DÊ UM ZUM!











Você consegue perceber o que escorre pela calçada até o meio-fio? Aquela mistura fétida, da cor do azeviche, com restos de comida que forma um veio que se espraia pela calçada e que, finalmente, alcança o meio-fio daquela rua? Amanhã, quem sabe, o tal veio será visto em outra calçada, próxima desta de agora. Ou, na mesma.

Não desvie o olhar. Dê um zum!

Observe os detalhes da cena. Acompanhe de onde parte o veio.

Existe logo ali um pé, descalço, magro, que se confunde com o líquido espesso, escurecido, fétido. Ele é parte de um ser humano que sobre a calçada, junto à parede, jaz inerte sob o efeito de alguma droga.

É pena que o zum não tenha um tanto de magia e que pudesse recuar no tempo e fornecer alguma outra cena que, talvez, explicasse o motivo daquele ser estar ali jogado. E são tantos em tantos lugares, já por tanto tempo.

O DNA é o mesmo, mas os lugares de origem são diversos. E será este último dado relevante no processo que se desencadeou até atingir a cena da calçada?

Não, necessariamente. De comunidades que sobrevivem de restos, mesmo aí temos seres que ascendem. O meio é importante, a genética, também. Há algo, porém, que se instala quando da formação de alguns seres e que deposita sobre eles um perfil psicológico diferenciado. São marcas que se impõem, mais fortes do que o ambiente que os cercam, tornando-os mais aguerridos, mais batalhadores.

Seres oriundos de uma mesma família reagirão de forma diversa às vicissitudes que a vida vai impondo. Alguns membros marcados pela violência doméstica zarparão sem temor mundo afora, buscando melhores condições de vida. Outros quedarão sem rumo. Arrastarão, pelos dias que se sucederem, a desesperança, o medo, a rejeição que, muitas vezes, se autoimpuseram. Para estes caberá o olhar atento da comunidade e o apoio de instituições de Estado que buscarão encaminhar os que quedaram pelo caminho, atropelados pelos infortúnios de origem.

Uma comunidade carente necessita de apoio de órgãos criados para realizar este trabalho. O objetivo é evitar que mais indivíduos se arrastem por calçadas e viadutos, levando seus parcos pertences, disputados entre si.

Para os que já fizeram a rua de morada, faz-se necessário o recolhimento para Unidades de Recuperação, pois depois de certa involução na escala social, nada mais é possível fazer-se sozinho. A recuperação deverá ser feita dentro de instituição mantida com o dinheiro público, fruto dos NOSSOS IMPOSTOS, arrecadados e direcionados com HONESTIDADE por quem detém esta tarefa, visando ao BEM DE TODOS: ao BEM DA CIDADE, por ser ela uma célula única que a todos contém.

O objetivo maior deve ser evitar que mais criaturas se espalhem pelas calçadas, num ritmo cada vez mais veloz, direcionando todos os esforços para que elas se tornem úteis, capazes de sobreviverem de forma digna. O trabalho, em todas as esferas da sociedade, deve ser fomentado como único meio de preservar a autoestima, sendo o motor propulsor para uma socialização com ganhos para todos os moradores da cidade.

É utópico? Talvez!

Agora, está mais do que na hora de que algo aconteça nesta direção. É absolutamente necessário ter a esperança de mudança.

E é a própria utopia que dará origem ao movimento de constante caminhar na solução dos problemas.

Que haja força e boa vontade em nossa aldeia para que se consiga direcionar, por outros caminhos, milhares de carentes a arrastar-se pelo lixo.

Que uma conscientização crescente da comunidade proteste por direitos e garantias a ela sonegados.

Caso contrário, não será nem mais preciso dar um zum. Você, leitor, não conseguirá mais desviar o olhar, porque a calçada estará tomada. As ruas, os parques e os canteiros, também.

Ou, quem sabe, você também tão espoliado não terminará como estes seus irmãos, menos afortunados: na calçada.

Agora, se falarmos daqueles grupos bem menores, quero crer, mas extremamente danosos, o dos corruptíveis e o dos corruptores, eles não mais estarão por aqui, neste momento, para contar a história de ERA UMA VEZ UM PAÍS RICO ................................................................................................................

Ah! Esqueça o zum!

Tudo terá se agigantado. Seus olhos não mais precisarão deste auxílio.



Sinceramente, quero acreditar, ainda, que aquela calçada, que conheço tão bem, possa conter, num futuro não muito longínquo, apenas os restos de chuva com as flores do jacarandá da esquina. E que a água depositada no meio-fio seja de um tom violáceo, que nem as flores do mesmo jacarandá.

Segundo Edgar Morin, sociólogo e filósofo francês, a vida é suportável se nela for introduzida não apenas a utopia, mas a poesia, ou seja, a intensidade, a festa, a alegria, a comunhão, a felicidade e o amor. Há o êxtase histórico, que é um êxtase amoroso coletivo.



De ambas, utopia e poesia, Mário Quintana entende muito bem. 

Eis, sua receita:




Agora, o samba MENOR ABANDONADO, cantado por Zeca Pagodinho, espelha bem a realidade que nos cerca e aquilo que pode ser feito para mudá-la.



Já o poeta Manuel Bandeira com seu poema O BICHO dá-nos um choque de realidade, quando verseja: 





Fiquemos com os dois primeiros exemplos. São um alento e um alerta para que não se torne corriqueira a última cena, embora Manuel Bandeira a tenha descrito na década de 40. 

Há que não se perder a esperança, porém.




Samba - Menor Abandonado – Zeca Pagodinho





quinta-feira, 2 de outubro de 2014

O PLANO











Lá se vão os pezinhos sobre o cascalho. Logo, estarão ultrapassando o portão do pátio do avô. Soltaram o guri e lá se foi ele. O caminho já era conhecido. Lugar bom aquele! Lá era sempre recebido com abraços e guloseimas. Tomara que, no próximo domingo, pudesse voltar.

O pote com água adocicada está ali para atraí-lo. E ele vai se chegando, aos poucos. Brevemente, fará este trajeto todos os dias. Espera sempre encontrar aquele presente.

Pois, um novo professor chegou. E, desta vez, Marcelinho conseguiu entender a explicação sobre as orações coordenadas e subordinadas, matéria que jamais tinha aprendido. Que professor legal! Tomara que ele permaneça com a turma do Marcelinho por muito tempo.

Com o reforço que o time recebeu, seus integrantes acreditam que irão obter melhores resultados nos certames vindouros.

As muitas horas em que Marina debruçou-se sobre aqueles tantos livros e o seu visível esforço para vencer o exame que está por vir, dá-lhe a esperança de conquistar uma boa classificação naquele concurso tão concorrido.

Aquela palavra do médico, que José aguardava há tanto tempo, foi motivo de grande alegria. Esperara por longos meses, mas valera a pena.

A embalagem, pendurada no galho mais baixo da árvore, sinaliza que, como das vezes anteriores, hoje também terá um reforço ou, dependendo do dia, apenas essa sobra para alimentar-se. Mantém a esperança diária de ali encontrar o que os olhos, lá da esquina, antecipam e que irá acalmar aquela incômoda e constante carência. Poeticamente, a imagem comove. A realidade, mais ainda. O caminho para a solução desta necessidade não é, porém, o de apenas recolher o que se encontra à mão. O caminho é bem outro.

Em todas as situações descritas subjaz aquele desejo de que se cumpram nossas expectativas.

Claro que um olhar de esperança sobre o que nos cerca é alimentar a possibilidade de que os sonhos são possíveis de serem concretizados.

O plano é este. Mas não apenas este.

Caberá a quem detiver em mãos as rédeas do poder constituído fazer o dever de casa com competência e honradez. Criar uma política de inserção social, através do trabalho, de indivíduos plenamente capazes para o exercício de atividades produtivas as mais diversas: esta a meta principal.

Todo o sonho carece de ação para que se torne realidade. A força do trabalho é que dará esperança de melhores dias. Benesses não nos levam a lugar algum. Pelo contrário!

Estudo e trabalho são o binômio capaz de inserir os indivíduos num patamar digno de uma sociedade que se quer evoluída e democrática.

Como dizem os versos da poesia O SONHO E A ESPERANÇA, de Luiz Coronel, transcrita abaixo na íntegra, entre o sonho e a esperança existem sutis fronteiras. A esperança traz encomendas, enquanto o sonho indaga respostas. Então, a esperança monta o palco do espetáculo, afia as lanças, ilumina os edifícios e desperta os homens com seus clarins solidários.

A citação que abre o referido poema, na publicação original, é uma homenagem de Luiz Coronel ao poeta modernista norte-americano Wallace Stevens que escreveu:

“O sonho é a mente reagindo à pressão da realidade”.

O plano é reagir ao status quo, movido por sonhos carregados de esperança por dias melhores.

Perseverar nas melhores ideias frente às inúmeras existentes, mantendo-se aberto ao diálogo e ao caráter ecumênico das relações, também é desejável.

Como escreveu Mário Quintana em seu CADERNO H, recheado de epigramas, sobre as IDEIAS quintanou:

“Não sou desses que um dia pensam uma coisa e no outro dia pensam outra coisa muito diferente. Eu penso as duas coisas ao mesmo tempo. Duas ou mais. Não tenho culpa de ser ecumênico”.

Agora, segundo Quintana, o provérbio, que diz que a esperança é a última que morre, não está correto. Escreveu, na página 146 do seu CADERNO H, o seguinte:

“Não, o provérbio não está bem certo. O raio é que enquanto há esperança, há vida. Jamais foi encontrado no bolso de um suicida um bilhete de loteria que estivesse para correr no dia seguinte...” (A Esperança)

Portanto, o plano é manter a vida porque, em ela havendo, haverá esperança. Sem ela não restará esperança.

O plano é viver para assistir às mudanças sonhadas tornarem-se concretas, através de muito estudo, trabalho e de uma consciência cidadã.

Aliás, Martinho da Vila, no samba O PEQUENO BURGUÊS, seu primeiro sucesso nacional, descreve muito bem o que é necessário para se chegar à condição de um ser considerado privilegiado. Ao final do samba, afirma que quem quiser ser como ele, o protagonista da letra, terá que penar um bocado.

Com certeza, sacrifícios serão necessários. Dizem que aqui não se chega para passear. Ou melhor, também para passear quando as condições financeiras já permitirem.

É! O plano é desafiador!

Compensador, porém, para quem o enfrenta com as armas corretas, a saber: educação e trabalho.






O Pequeno Burguês - Martinho da Vila





quarta-feira, 17 de setembro de 2014

O PEZINHO


Pois o guri, lá pelos seus quinze anos de idade, era do tipo desconfiado, meio arisco, mais muito observador.


Certa vez, foi dar uma espiada num baile lá pras bandas onde o diabo perdeu as botas. Era um baile daqueles chamados de “cola atada”. Uma coisa que jamais vira antes! O ritmo do vanerão o impressionara, também. Pela fresta da janela, imaginou-se no salão, dando voltas e mais voltas. Lembrou-se do salão paroquial da cidade onde, vez por outra, aconteciam fandangos organizados pelo CTG local. Lá, também, costumava dar uma espiada. Nunca pudera ir, porém. Era seu sonho...


Nos domingos, dia que poderia participar, saía com um tabuleiro a vender doces: imposição de sua mãe. Não levava jeito para vender. Aliás, quando passava, ouvia sempre alguém a fazer gracejos, tipo: “Cuidado com o tabuleiro! Vai cair se balançar demais! Firma o passo!”. Sentia-se observado por todos.

Em casa, não sabia por que a mãe o tratava com certa rispidez. Soube que ela própria escolhera seu nome: Orlando. Sempre achara um nome “forte”.

Passaram-se os anos, e com eles sua inclinação superou até o próprio nome. Sentia-se, lá pela casa dos vinte anos, mais como Orlandinho. Aquele que aprendera a pôr as mesas de um restaurante conhecido na cidade. E como era benquisto pelos fregueses! Circulava entre as mesas, equilibrando bandejas, pratos e copos com graça e desenvoltura. Em passos medidos, atravessava o restaurante de um lado a outro, quase como numa dança ensaiada.

Tornara-se, com os anos, mais solto, mais descontraído. Aqueles tempos de acanhamento, desconfiança e insegurança tinham-se ido. Sua mãe falecera já há algum tempo. Suas duas irmãs, mais velhas que ele, não se preocupavam muito em saber por onde ele andava. Isto, até certo ponto, era bom. Não tinha que estar dando satisfação à família. Esse afastamento, por outro lado, exigia dele certa dose de decisão e a responsabilidade por seus próprios atos. Vez por outra, tinha a sensação de estar solito no mundo.

Foi quando apareceu, no restaurante, o Ângelo. Rapaz mais velho, tipo que china se engraça. Fora contratado, também, como garçom. Era um xiru gentil com todos os fregueses. Passado algum tempo, já formava com Orlandinho um par perfeito. Um, servia com prazer à clientela, circulando por entre as cadeiras, quase como num balé. O outro, um galanteador. Tinha sempre uma palavra de elogio, especialmente às mulheres frequentadoras do estabelecimento.

Agora, o melhor de tudo é que Ângelo gostava de ir a fandangos. Aliás, pertencia à invernada artística do CTG da cidade. Dançar era com ele mesmo. Na dança dos facões, desafiava com garbo. Mas era na chula que demonstrava toda a sua destreza, tirando fininho da lança largada no chão. As esporas chegavam a brilhar e zunir naqueles movimentos viris que, Orlandinho, fascinado, assistira uma vez. Não mais esquecera.

Nessas alturas, a amizade entre os dois já se estabelecera. Uma amizade que preservava as diferenças, sem nenhum problema. Ou seja, cada macaco no seu galho.

E através de Ângelo foi que Orlandinho entrou para o CTG. A sua grande estreia deu-se quando, integrando também a invernada artística, dançou O Pezinho com Mariana.

No outro dia, a prenda foi ter com o Patrão do CTG. Disse a ele que não queria mais fazer par com Orlandinho. Ele não só quase pisara, por várias vezes, nos seus pés, como também ela observara alguns gestos estranhos em Orlandinho. E, chegando mais próximo do Patrão, disse que, durante a dança, pegara Orlandinho segurando, por instantes, a bombacha, enquanto fazia o rodopio. Convenhamos, disse Mariana, que este gesto devia ser mais seu como prenda, do que dele. Além do que, o lenço vermelho, ao redor do pescoço, era mais uma espécie de laçarote, num degradê, puxando para a cor rosa. E por isso não queria mais dançar com ele.

A notícia espalhou-se. Quase que as portas do CTG fecharam-se para Orlandinho. Por sorte, com a intervenção de Ângelo, o amigo Orlandinho permanece, até hoje, no CTG. Não mais na invernada artística, mas no bar, onde faz “uns bicos” quando tem fandango. Quando está em serviço no bar, costuma usar umas alpargatas. São, assim, meio diferentes. Há uma rosinha, pequenininha, minúscula, estampada sobre o peito do pé. Ninguém sabe de onde surgiu aquele calçado. As bombachas são mais justas que o modelo tradicional. 

Agora, o Patrão está de olho nele! Qualquer deslize maior, ele será convidado a retirar-se.

Até já avisou:

“Aqui, o laço do lenço não é laçarote; lenço vermelho não é vermelho degradê; bombacha não é fusô e, principalmente, a montaria oficial continua sendo o cavalo.”

E estamos conversados.



Agora, não sei não!

A coisa anda mais a perigo que minhoca no galinheiro. Facilita o Patrão vai acabar mais arranhado que pau que gato trepa. Qualquer dia, a expressão “sair do armário” cairá em desuso. Ficará no passado.

E o Orlandinho?

No fandango, dançará aquele “vanerão”. Claro, não de cola atada. Que isto não é tradição: é esculhambação.

Ou, quem sabe, um “bugio” meio diferente, aquele que chamam de “bugio do pezinho”, que pode ser apreciado no primeiro vídeo abaixo.

Ah! Mariana também é um nome forte, como ficou demonstrado no vídeo seguinte.



Orlandinho aguarda ansioso estes novos tempos...

Aguardemos: todos nós.







Bugio do Chico – Os Serranos 




Adeus Mariana – Oswaldir e Carlos Magrão 






segunda-feira, 30 de dezembro de 2013

AMANHÃ? SERÁ UM NOVO DIA!

 
Amanhã, Paula fará duas provas, bem importantes, que a tem preocupado. São conteúdos bastante difíceis. Terá pela frente, ainda, mais três dias de provas. Na semana seguinte, em hora e dias marcados, saberá os resultados. Poderá, então, comemorar ou não. De qualquer maneira, na semana posterior, viajará para a praia. Torce para que o dia escolhido para a viagem apresente bom tempo. E que haja uma luminosidade intensa, com muito sol e calor, prenunciando as condições ideais para as férias tão aguardadas. Com certeza, no dia seguinte, curtirá uma bela praia, coisa que continuará fazendo durante toda a temporada. Espera, a cada dia, fazer novas amizades.
Serão dias que se renovarão a cada manhã.
 
Claudinha espera, com ansiedade, os finais de semana, que se repetem a cada quinze dias, oportunidade em que o pai vem buscá-la. Tendo seus pais se separado, essa é a ocasião em que desfruta com ele de momentos que a deixam muito feliz.
 
Raulzinho até não acredita que a tia Helena vai lhe dar um uniforme completo, do seu clube do coração, para que ele jogue futebol no time do bairro. Ela prometeu que irá comprá-lo já no dia seguinte em que receber o salário do mês. E ele não cansa de contar os dias, que parecem nunca chegar ao dia marcado.
 
Vó Margarida conta os dias para fazer a tal viagem à Capital, quando conhecerá Isadora, a netinha recém-nascida.
 
Fernanda espera, ansiosamente, o dia marcado para buscar o exame, tão aguardado, que revelará se o seu sonho de ser mãe irá se concretizar.
 
Roberto aguarda, com grande expectativa, o resultado dos testes feitos para o novo emprego de que tanto precisa.
 
Snoopy, o gracioso Shih Tzu, sempre em alerta, aguarda o momento em que se abrirá a porta e sua dona lhe pegará no colo, fazendo-lhe, como sempre, os tão esperados afagos.
 
Até a idosa Geci, que assiste, pela segunda vez, a uma novela tão sua conhecida, também aguarda o dia seguinte com certa ansiedade. Talvez, apareça aquele familiar que prometeu vê-la brevemente. A esperança, afinal, não pode morrer.
 
Ela é que nos move. Ela faz parte do amanhã. E o amanhã é qualquer dia que virá, menos o hoje, pois esse já é.
Todos os dias seguintes ao de hoje são importantes. O amanhã nos reserva a possibilidade de os sonhos tornarem-se realidade.
E sonhos e desejos quem não os tem? Se a consciência e a lucidez estiverem presentes, será possível descortinar o dia de amanhã com esperança.
Portanto, a tão conhecida “virada” acontece todo dia seguinte ao hoje.
Os sonhos, em especial, constroem-se no dia a dia. Então, não depositemos apenas numa noite, de um final de ano, que precede um dia, todas as expectativas de mudanças e realizações.
Lembremo-nos que, como já diz a música MARCAS DO QUE SE FOI, “todo dia nasce novo em cada amanhecer”.
Que as marcas do tempo, se ficaram, sirvam de mola propulsora para um salto de qualidade. Que o inventário dos dias passados não redunde em lamúrias.
Que as pessoas se joguem de cabeça no dia seguinte ao hoje. Não apenas na travessia de 2013 para 2014, mas, principalmente, em todos os dias do novo ano.
É bom lembrar que todos os dias, afora hoje, serão novos dias.
E que sempre haja a esperança, com redobrada força, de que o amanhã será melhor, de que “será pleno”, como dizem os versos finais de outra bela canção.
 
Um Feliz 2014 a todos nós.
 
 
Marcas do que se foi
 
 
Amanhã - Guilherme Arantes